por Sonia Barreira*
O debate sobre a importância da educação online ou a distância, neste período de isolamento social, parece ter conseguido consensos e até unanimidade quando falamos das crianças maiores, dos pré-adolescentes e dos jovens. Tanto as escolas como os órgãos oficiais se apressaram em viabilizar o seguimento do ano letivo com o ensino a distância e os educadores passaram a enfrentar o desafio diário de manter todos os alunos e alunas motivados, interessados e construindo conhecimentos.
Mas e os menores, de 4 e 5 anos? A controvérsia, neste caso, pode ser maior.
Há aqueles que falam apenas em manutenção do vínculo, por meio de histórias e vídeos, e em muitas escolas, os professores têm mantido contato com suas turmas e distraído os pequenos em alguns períodos do dia. Afeto e entretenimento.
Mas será que a necessidade das crianças dessa idade se limita a isso? Sabemos que, nessa faixa etária, os pequenos aprendem muito por meio das representações, do “faz de conta” e por isso brincar é tão importante. Afinal trata-se de uma poderosa atividade espontânea que ajuda as crianças a compreenderem o mundo, a organizarem seus sentimentos e a expressarem seus desejos e medos, além de favorecer maneiras de interpretar a realidade. E, para isso, nada melhor do que o convívio com seus pares em ambiente seguro. É exatamente o que não temos agora!
E é precisamente por essa razão, que os educadores especializados na infância fazem ainda mais falta nesse momento. Se as crianças já estão privadas do convívio e dos desafios das brincadeiras espontâneas, precisam ainda mais de boas e adequadas propostas para que possam seguir aprendendo e desenvolvendo suas capacidades humanas.
Se não há a briga e a disputa pelo brinquedo nas atividades presenciais, o educador pode oferecer narrativas que trazem a experiência do conflito e das possíveis resoluções. Os filmes selecionados por eles podem permitir a vivência de situações que levem posteriormente, numa conversa online com os amigos a discutirem as atitudes dos personagens, a evocar situações semelhantes já vivenciadas e a se colocarem no lugar do outro.
Se o espaço físico é restrito, o educador pode criar situações de desafio para o controle motor, equilíbrio, ritmo e favorecer a construção de habilidades físicas em contextos lúdicos. Se os materiais de casa não são os ideais para práticas das artes plásticas, é ainda mais importante o conhecimento dos professores para as propostas diversificadas que permitam as representações ricas e criativas da infância.
Da mesma forma, o processo de alfabetização não deve ser interrompido e o professor deve seguir criando propostas de uso da linguagem escrita que sejam estimulantes e levem as crianças a relacionar a pauta sonora com a pauta gráfica, estabilizar a escrita do nome próprio, brincar de encontrar diferenças e semelhanças em textos variados. Se a escola pode prover a criança desse tipo de estímulo estará garantindo o desenvolvimento cognitivo usando novos recursos, talvez não explorados anteriormente, mas possíveis e necessários agora.
Os familiares, por sua vez, podem propor jogos e explorações das quantidades e suas representações, mas são os educadores infantis aqueles que poderão ainda melhor criar situações problema instigantes que incentivem o raciocínio lógico, que desafiem as contagens e os registros de quantidades em contextos divertidos que garantem as aprendizagens adequadas para cada faixa etária.
As crianças são pequenas, e o uso excessivo da tela não é recomendável, é verdade! Mas este período em casa permite certa flexibilidade, assim é possível que os familiares escolham os melhores horários para as atividades enviadas pelos professores. As atividades menos dirigidas, podem ser realizadas pelos pequenos nos momentos em que os adultos precisam trabalhar, ou se ocupar com os afazeres da casa, mas também se pode reservar um tempinho para aquelas propostas que realmente precisam da nossa mediação.
O importante é que a escola e a família não se furtem de suas responsabilidades: os pequenos precisam de muito mais do que afeto e distração, necessitam de nutrição cultural, desafios físicos, cognitivos e morais.
Afinal, há muito tempo a educação infantil deixou de ser curso preparatório para a escola de verdade, a chamada “pré-escola”, pois a sociedade reconheceu as necessidades das crianças de 4 e 5 anos de aprenderem e se apropriarem das ferramentas que ajudam a interpretar o mundo. Não as deixemos sozinhas agora.
*Sonia Barreira foi sócia-fundadora da Escola da Vila onde atuou como diretora pedagógica por 40 anos. Atualmente é diretora pedagógica da Bahema Educação.
Imagem: romrodinka/iStock.com